quinta-feira, 6 de janeiro de 2011

A carta

“Eu te amo”. De todas as palavras, essas eram as mais repetidas e carregadas de certeza que eu podia pronunciar. E acreditava que poderia fazê-lo para sempre. Mas, cercada pela vida, não contava com o fato de que quando as pessoas deixam de existir (no sentindo de que elas se mantém vivas mas se tornam outros seres, com outros valores) nós, talvez, percamos a capacidade de reconhecê-las.
Se me indagarem , jamais negarei o quanto complicou, deteve manteve por longa data o meu coração em suas mãos enquanto era jovem. E o fato de ter-me apenas na juventude não coincide com a aparência física ou qualquer outro significado superficial. E digo ainda mais, você jamais deixou de despertar-me um sentimento. Fosse bom ou ruim, lá estava você arrebatando cada miserável parte do meu corpo. Não havia no mundo uma pessoa que não soubesse a quem eu costumava pertencer. E para falar a verdade, guardarei com carinho (porque guardar amor é demais para mim, preciso distribuí-lo e recebê-lo de volta num ciclo totalmente vicioso) todos os detalhes do que você foi. Apaixonado, cego, tolerante, possessível e amável por inteiro. Tudo isso que você hoje, parece desconhecer. Eu guardo você como uma fotografia antiga, um disco de vinil ou um papel amassado. Mesmo tão quietos, simples e passadistas, trazem à tona uma história intrigante para contar. E nós sabemos, essa história nunca será esquecida.
Hoje eu lhe encontro nos jornais, seus olhos são os mesmos de quando tínhamos quinze anos. Aquele olhos vivos que enganam quem está a sua volta e que entrelaçam qualquer moça indefesa. A notícia dizia que você se dava muito bem em seus negócios, e eu não vou negar que desconfiei da sua honestidade fraca em meio a tanta riqueza, mas logo esqueci porque não sou do tipo que se ocupa do passado. Todo ser humano aprende que lidar com o presente é muito mais vantajoso.
Uma vez, numa conversa já entre desconhecidos, daquelas em que eu não sabia se era sua namorada que fazia sua cabeça ou se ela também era vítima da sua falta de compostura, você me mandou ser feliz. Mas era tarde demais! Eu sempre fui. Quando montaram a barraca do beijo, do abraço e da felicidade eu saí correndo em direção à última e garanti o primeiro lugar da fila porque sabia que beijos e abraços também são felicidade. Então, tratava-se de barracas iguais, em que uma era mais completa (a que eu escolhi).
E depois dessa conversa, substituí o carinho imenso que sentia (que um dia fora amor) por uma pena horrível, terrível, gigantesca e verdadeira. Olhava para você e via uma criança faminta que nada sabia sobre a vida. E não devia saber mesmo!
Então eu pensava: “sem rock and roll, querido, você terá mesmo dificuldade de libertar-se” e sentava no sofá, tranqüila, bebendo meu café até que o sono chegasse.
Penso que o dia em que dissemos Adeus pela primeira vez deveria ser também o dia que deveríamos dizer Adeus pela última vez, porque dali pra frente você se tornou um inferninho. Mas não lhe culpo por isso, a culpa foi minha de tanto insistir em um merda.
Hoje não me arrependo de nada além de ter confessado, na última briga, o quanto seu cabelo me incomodava e seu olhar falso me fazia pirar de raiva. Você ficou se achando o máximo por três semanas pois teve a certeza de que eu ainda reparava no que fazia.
Depois disso sumimos pelo mundo. Eu conheci alguns caras esquisitos desde surfistas que quase morreram afogados à atendentes de lojas de roupas que se ofereceram como mercadoria para as clientes. E com tanta confusão, eu encontrei um alguém único (e foi sem querer, quase de olhos fechados). Ele me abraça, sorri, me olha com amor, me dá as mãos mesmo quando estamos sozinhos e mexe nos meus cabelos para que eu pegue no sono com calma. É forte porque eu sinto que se ficarmos distantes por pouquíssimo tempo meu coração se enche de saudade. E, além do mais, eu não tenho dúvidas de que ele tem não só meu coração, mas toda a minha vida.
Escrevo sobre ele, porque quero dizer-lhe que aquele papo furado de que o primeiro amor é o mais puro e verdadeiro não deu certo comigo. Eu quebrei a cara algumas vezes e é claro que foi inesquecível, mas não foi o mais importante entende?
Você não se tornou uma pessoa melhor enquanto esteve comigo e isso bastou para provar que talvez não tenha sido amor da sua parte ou simplesmente que não daríamos certo. E não demos.
Eu não me importo se tenho ou não notícias suas, sou feliz e ocupada demais para dar atenção a quem não merece meus sentimentos. Por isso, ignorei aquela notícia que falava de você, e num ato involuntário, quase que sem perceber, atirei o jornal à lixeira e nada aconteceu no meu coração.
A maior verdade de tudo isso é que a nossa separação tardia tratou de esmagar o que ainda sentíamos de bom e aqui há o que restou: N-A-D-A. É contraditório, porque de tão longo caminho juntos, não tivemos tempo de nos despedirmos. E é este o motivo desta carta, é uma despedida longa e seca. Eu disse tanto sem lhe dizer nada (porque você não é daqueles que tentam entender as entrelinhas ou que deixam as emoções dominarem). Então, aqui está: Sou muito feliz, espero que tenha aprendido com a vida e Tchau. Aliás, até nunca mais. Foi quase bom conhecer-lhe (pois uma parte de mim ainda espera ansiosamente pela volta do que você não consegue ser mais).
Por: Gabi Macedo

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